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segunda-feira, 2 de abril de 2018

O continente africano vai mesmo dividir-se em dois

O continente africano vai mesmo dividir-se em dois


Os indícios de que a África vai ver parte do seu território tornar-se um pequeno continente autônomo são cada vez mais nítidos, defendem vários investigadores e geólogos. E a fissura que se abriu no Quênia, e que foi notícia há cerca de uma semana, só vem comprovar isso, garantem.

Lucia Perez Diaz, investigadora de pós-doutoramento do Grupo de Investigação das Dinâmicas das Falhas Tectônicas, da Faculdade Royal Holloway da Universidade de Londres, é um dos peritos que defendem essa tese.

Num artigo publicado este sábado pelo Daily Mail, a investigadora avança que, tal como aconteceu há 138 milhões de anos entre os continentes americano e africano, também a placa leste africana deverá acabar por se separar.

A divisão só deverá ocorrer, no mínimo, daqui a 10 milhões de anos. Quando tal acontecer, cinco países - a Somália, metade da Etiópia, o Quênia, a Tanzânia e o norte de Moçambique - deverão ficar num continente isolado (a que para já os geólogos chamam a Placa Somali) criando-se uma nova bacia oceânica.

A separação deverá acontecer ao longo do Rift Valley, ou Vale da Grande Fenda, no leste de África, que se estende ao longo de 3.000 km, desde o Golfo de Áden, na costa somali, a norte, até Moçambique, a sul.

Segundo cálculos de Lucia Perez Diaz, a fissura do Quênia começou há 30 milhões de anos na região de Afra, no norte deste país, e tem vindo a propagar-se para sul à velocidade de 2,5 cm a 5 cm por ano.

A investigadora diz que a fissura agora posta em evidência por recentes movimentos tectónicos - que abriu uma fenda de cerca de 20m de largura e 50m de profundidade no Quénia e destruiu um troço de autoestrada - são "a fase inicial de uma desagregação continental".

Assim, o panorama ficcional que José Saramago criou, em 1986, em a Jangada de Pedra, poderá mesmo verificar-se, só que em vez de ser na Península Ibérica, será na Costa Leste de África.

Fonte:

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

BRASILEIROS ESTÃO ENTRE OS 'MAIS IGNORANTES' DO PLANETA, DIZ PESQUISA

BRASILEIROS ESTÃO ENTRE OS 'MAIS IGNORANTES' DO PLANETA, DIZ PESQUISA


quinta-feira, dezembro 15, 2016
Wilson Roberto Vieira Ferreira



Certa vez o sociólogo francês Pierre Bourdieu provocou: “a opinião pública não existe”. A pesquisa “Perils of Perception 2016” (Perigos da Percepção) do instituto britânico Ipsos Mori parece confirmar isso: na verdade a opinião confunde-se com percepção, assim como nos telejornais atuais as notícias são confundidas com “sensações”, seja dos jornalistas ou dos telespectadores. O resultado da pesquisa foi a criação do “Ranking da Ignorância” – a distância entre a percepção que as pessoas têm da realidade em que vivem e os dados oficiais de cada país. O Brasil ocupa os primeiros lugares, atrás da Índia, China e EUA. Entre os países menos “ignorantes”, Holanda e Coréia do Sul. Incapacidade de entender estatísticas, preconceito, atalhos mentais, ignorância racional e o “poder das anedotas” das mídias estão entre os fatores apontados pela disparidade entre percepção e realidade. Também há um fator comum entre os países primeiros colocados: o monopólio midiático.

É comum na grande imprensa as palavras “percepção” e “sensação” serem tomadas como sinônimos. Por exemplo, em um telejornal fala-se da necessidade de construir um posto da Polícia Militar na praça de um bairro com altos índices de criminalidade. Segundo o repórter, o posto criaria uma “percepção de segurança” para os moradores.

Ou então fala-se em “sensação de crise” no final do ano quando, na base do olhômetro, o repórter conta o número de pessoas que não carregam sacolas de compras em um shopping.

Ou ainda quando se faz uma rápida enquete com populares em algum calçadão do centro da cidade para confirmar alguma “percepção” sobre qualquer coisa.

Atualmente, notícias se confundem com “percepções” ou “sensações” tomadas como evidências sobre qualquer suposta tendência, crise ou acontecimento. É o que recentemente tem sido denominado de “pós-verdade” – um grande arco que vai do menosprezo por fatos objetivos até a ignorância racional e o efeito Dunnig-Kruger – indivíduos acreditam saber mais do que especialistas por estarem abastecidos por clichês, sofismas e frases prontas.

Porém, percepções não são a realidade. É o que comprova a pesquisa do Instituto Ipsos Mori “Os Perigos da Percepção 2016”, realizada entre os meses de setembro e novembro envolvendo 40 países. O objetivo é demonstrar o quanto as pessoas têm uma interpretação equivocada da sua própria realidade – a diferença entre a percepção (desvalorização ou exaltação de determinados temas que preocupam a sociedade) e os dados estatísticos oficiais de uma determinada realidade.


A partir dos dados coletados, a pesquisa conseguiu traçar o “índice da ignorância”, listando os países cuja percepção é mais distante da realidade.

A Índia aparece em primeiro, seguida por China e Taiwan. O Brasil figura em sexto lugar, após os EUA. Na ponta oposta do índice estão Holanda, Reino Unido e Coréia do Sul.

Aqui o conceito de “ignorância” não implica em falta de inteligência, mas apenas falta de conhecimento ou informação objetiva sobre uma realidade. O objetivo principal da pesquisa é levantar questões sobre o porquê da disparidade entre a percepção e os dados oficiais de cada país.

Os Resultados


Segundo a pesquisa, os brasileiros acham que a população muçulmana no País é muito maior (12%) do que na realidade (menos de 0,1%) – França, no topo, 31% contra 7% na realidade. E se equivocam ainda mais por acreditar que até 2050 que a religião islâmica chegará a 18% da população, enquanto dados reais que chegará no máximo a 1%.

Perguntados sobre a proporção da população que diz ser feliz, os brasileiros falam em 40% enquanto estudos indicam que são 92% aqueles que se consideram felizes.

Brasileiros também se equivocam quanto a proporção da distribuição da riqueza: para os entrevistados, os 70% menos ricos detém 24% da riqueza quando a realidade é muito pior, apenas 9%.

Ainda consideram que o Brasil é mais tolerante do que realmente é. Os entrevistados acreditam que mais de 50% da população acham que a homossexualidade é moralmente aceitável. Mas dados oficiais apontam que só 39% pensam assim.

Ranking de 2015

Quanto ao sexo antes do casamento, os brasileiros sobrestimam o preconceito: acham que 43% não aceitam – quando o dado real é 35%. E o inverso é sobre o tema aborto: acham que 61% devem considerar moralmente inaceitável. Dados reais indicam 79% da população.

              Os dados coletados sobre a percepção dos entrevistados foram confrontados com diferentes fontes de informações oficiais e institutos de pesquisas de cada um dos países.

Bombas Semióticas


Os resultados sobre os Perigos da Percepção do Ipsos Mori confirmam os resultados do atual estágio da engenharia de opinião pública, não mais focada nas estratégias hipodérmicas de repetição e doutrinação político-ideológica do passado, mas agora concentradas na detonação do que o Cinegnose chama de “bombas semióticas” que torna-se instrumento da “Guerra Híbrida” – através da moldagem da percepção por estratégias de “agenda setting” e “espiral do silêncio” criar “climas de opinião” que evoluem para “ignorância racionalizada” através dos clichês de noticiários que confundem notícia com percepção.

Os pesquisadores do Instituto Ipsos Mori apontam para alguns motivos sobre essa discrepância entre percepção e realidade:

(a) Inabilidade com números


Somos particularmente pouco hábeis em lidar com cifras numéricas ou muito elevadas ou muito pequenas – o que afeta nossa capacidade de pensar em, por exemplo, distribuição de renda ou em supervalorizarmos os números sobre gravidez na adolescência, como mostram dados sobre crimes praticada por menores: a percepção é de 70% quando dados oficiais apontam para 20% .


(b) Preconceito e “atalhos mentais”


Tendemos a pegar informações facilmente disponíveis, mesmo que não se encaixem perfeitamente em uma questão.

O sociólogo Pierre Bourdieu já apontava a falácia principal das pesquisas de opinião no texto “A Opinião Pública Não Existe”: partem do pressuposto que qualquer um sempre tenha uma opinião a dar. Na maior parte do tempo, as opiniões são compostas por um conjunto racionalizações, clichês ou frases prontas facilmente disponíveis e sempre repetidas pela estratégia de agenda setting, facilitada pelo contexto de monopólio midiático, como veremos abaixo.

(c) Emotional Innumeracy


Exaltamos ou desvalorizamos determinados temas influenciados por preconceitos e medos difundidos pela sociedade, criando a discrepância entre percepção e estatística – as representações diárias da mídia sobre ISIS arregimentando brasileiros em redes sociais, Oriente Médio e terrorismo levam a uma sobre-valoração dos números do crescimento de muçulmanos e imigrantes no país.


(d) Mídia e o “poder da anedota”


A identificação das notícias com a percepção (seja dos próprios jornalistas ou dos leitores e telespectadores) leva a grande mídia a buscar personagens, narrativas ou histórias exemplares que “comprovem” uma determinada “sensação” ou “clima de opinião” pré-existente: o repórter que fica contando o número de pessoas em um shopping sem carregar sacolas de compras para comprovar a crise econômica;

A história de um adolescente que caiu no crime para fugir da família; história emocionante de luta e dedicação de um empreendedor bem sucedido – o que cria a discrepância com os dados estatísticos oficiais: apenas 1% dos desempregados se beneficiam das políticas públicas de apoio ao empreendedorismo. 

(e) Ignorância Racional


Conceito no qual o custo de adquirir um novo conhecimento excede os benefícios que esse conhecimento traria.

Permanecer ignorante é racional (aqui pensada a racionalidade associada a lei do menor esforço). Principalmente quando há todo um movimento social e midiático de encarar a Política como uma prática em si corrupta, dispendiosa e distante e que, por isso, não traz nenhum benefício individual para o eleitor.

A ignorância seria uma resposta racional a um contexto político em torno de nós, no qual temos a percepção de não termos poder ou controle.


Percepção e monopólio midiático


O ranking da ignorância resultante da pesquisa Perils of Perceptionchama atenção para um detalhe final, porém decisivo: os seis países nas primeiras colocações (respectivamente Índia, China, Taiwan, África do Sul, EUA, Brasil) apresentam uma situação de monopólio, controle e censura midiáticas.

Apesar de variedade de dialetos, diferenças culturais e regionais e um sistema midiático aparentemente vibrante e pluralista, a Índia oferece um excelente estudo de caso sobre o poder da comunicação e softpower com Bollywood no cinema e a Sun TV na produção televisiva, como aponta Daya Kishan Thussu no livroCommunicating India’s Soft Power.

Na China o controle e censura em relação as novas mídias fechando jornais on line independente e o controle dos conteúdos pelo Partido Comunista. Chegando, inclusive a proibir filmes sobre viagens no tempo – o Cinegnose já discutiu o porquê.

Na África do Sul temos o amplo domínio da Naspers que controla 23 revistas (incluindo as mais lidas da imprensa cor-de-rosa), sete diários e o gigante da televisão por assinatura DSTV. Com mais de um século de existência, esta multinacional da África do Sul vende serviços em mais de 130 países. Incluindo o Brasil (com participação na editora Abril), a China - associada da Tencent, de serviços de Internet e telefonia.

Nos EUA seis corporações, os chamados “Big Six”, controlam a mídia:Time Warner, Walt Disney, Viacom, Rupert Murdoch, CBS Corporation e NBC Universal. Absolutamente dominam notícias e entretenimento.

Pior é no Brasil. Apenas as organizações Globo detém o monopólio das comunicações sob a estratégia da chantagem política (atualmente associada ao Poder Judiciário – Polícia Federal e Ministério Público) e controle do mercado publicitário mediante o BV – bônus por volume, propina paga às agências de publicidade que nela anunciam.

Além dos motivos apontados acima, certamente o monopólio dos meios de comunicação é a condição principal para se criar os três fatores que resultam em um “clima de opinião” ideal para moldar definitivamente a percepção da esfera pública: acumulação, consonância e onipresença midiática.

Fonte: http://cinegnose.blogspot.com.br/2016/12/pesquisa-coloca-brasil-entre-paises.html#more
DUFFY, Bob. "Perils Of Perception", Ipsos View, March, 2016

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

ACONTECIMENTOS DE UM GOLPE

ACONTECIMENTOS DE UM GOLPE 


Minhas humildes observações acerca dos últimos acontecimentos no Brasil, entendo que não da para abordarmos estes acontecimentos sem fazermos algumas breves considerações históricas, amarrando Brasil e conjuntura internacional, a nossa democracia que sempre apresentou fragilidades, chega ao fim novamente; a nossa história recente mostra que após vivermos 21 anos de um regime golpista, entre 1964 à 1985, que por meio da força e com amplo apoio da elite nacional, toma o país de assalto, deixaram o poder quando quiseram em 1985, aí nós temos a primeira inserção do PMDB - Partido do Movimento Democrático Brasileiro no poder, que naquele momento venceu a eleição, porém no colégio eleitoral com Tancredo Neves e por armadilhas do poder não assumiu sendo então substituído pelo vice, José Sarney, que até então era o líder do governo golpista pela ARENA - Aliança Renovadora Nacional e que desde o final da década de 1970, com o multipartidarismo passou a se chamar PDS - Partido Democrático Social, aí temos uma grande ironia: o líder do governo militar e golpista, no senado federal se torna presidente da república, era o início do período que os livros didáticos passaram a denominar de Nova República. Em 1988 é promulgada a nova constituição, a primeira sob os ventos da democracia, mas para muitos faltava a consolidação com o voto direto para presidente e isso ocorreu em 1989, a grande mídia sem perder a sua herança coronelista influi na vitória do seu candidato, Fernando Collor de Mello, que sofre um processo de impeachment em 1992, em um cenário muito diferente do de 2016 e é substituído pelo vice, Itamar Franco, novamente o PMDB a frente do país e novamente sem ter um voto. Fernando Henrique Cardoso, o FHC,  o "príncipe da Sorbone, agora no PSDB, fruto de uma desarticulação do PMDB, aliás o PSDB já foi bem diferente, como diria Bresser Pereira: "ele se afastou da social democracia e se alinhou ao neoliberalismo", na disputa do poder a qualquer custo, traça um caminho de articulações estabelecendo um pacto com o novo governo, ocupa mais de um ministério, usa o Plano Real como uma de suas bandeiras para derrubar o "sapo barbudo" e estabelece uma aliança com o PFL, atual DEM, o ápide do retrocesso político, inicia-se então a era PSDB, e o neoliberalismo no Brasil atinge o seu momento máximo, a política de privatizações devora estatais e dois mandatos são o suficientes para o esgotamento deste modelo. Vamos aqui abrir uma outra frente de ideias , enquanto a América Latina vivia as suas ditaduras sanguinárias, entre as décadas de 1960 à 1980, muitos países da Europa viviam a em um mundo bem diferente da social democracia; ainda a América Latina teria de viver governos neoliberais que infestaram o continente, durante a década de 1990, sob a influência do Consenso de Washington com políticas baseadas no "estado mínimo" proporcionando privatizações, avanço da terceirização, a economia ditado pelos interesses do capital, ventos de esquerda atingem o continente (que já foi considerado o "quintal" dos EUA), somente no inicio do novo século, apesar de que da vitória de Chávez, na Venezuela, já em 1998, esse movimento se espalha com as vitórias de Kirchner, na Argentina, Evo Morales na Bolívia, Lula no Brasil, Fernando Lugo no Paraguai e um pouco depois de Rafael Correa no Equador, entre outros exemplos, acredito que essas vitórias não transformaram estruturalmente parte da população e principalmente muitos eleitores não conseguem assimilar esse processo de vai do neoliberalismo para a centro esquerda, se deslumbram, muitas vezes, com as benesses deste momento e parte deles muda rapidamente de lado quando vê a crise chegar. 
Agora vamos nos ater ao golpe, um monstro com muitos tentáculos, o mais amplo é o político, com mais uma derrota em 2014 a oposição, particularmente PSDB/DEM, veem a possibilidade do PT permanecer no poder com Lula, em 2018 e 2022, desde o dia seguinte a derrota a oposição passa a trabalhar arduamente para a construção do golpe, temos inicialmente Aécio Neves incitando o ódio, que já o fazia durante a campanha eleitoral, seguem muitas marionetes nas manifestações que ocorrem já no final de 2014 nas ruas das principais cidades do páis, observamos um movimento articulado na classe média, (recomendo aqui a leitura do livro do Jesse Souza, "A tolice da Inteligência Brasileira"), mas para isso dar certo era preciso tirar o PMDB do governo e o capitão deste processo é Eduardo Cunha, o corrupto deputado federal do PMDB do Rio e então presidente da Câmara dos Deputados, ligado ao fundamentalismo evangélico, líder de um grupo de deputados que representam cerca de 40% da Câmara, seria necessário encontrar um pretexto: os votos que o PT não destinou a ele para salvá-lo da Comissão de Ética da Câmara, a partir disso se tem um show de horrores e o permanente discurso mentiroso das pedaladas e do "conjunto da obra", o outro tentáculo estava na justiça, que trabalha nas investigações da Operação Lava Jato e passa a enfatizar prisões de petistas, contando sempre com o apoio do último tentáculo: a grande mídia, os PIGs em ação, tudo que diz respeito a incriminar petistas sopram da justiça para a grande mídia, o ápice disso é a divulgação da gravação da conversa entre Dilma e Lula, quando da divulgação de que Lula seria indicado para Ministro da Casa Civil. Voltando a Eduardo Cunha, ele é o kamikaze do golpe, atrai a responsabilidade para si é incriminado pelo STF, até hoje não julgado, perde a presidência da Câmara dos Deputados, mas os golpistas precisam presentear Cunha pelos serviços prestados e isso poderá ocorrer com ele se livrando da cassação e a consequente permanência como deputado federal. O PMDB de volta ao poder e novamente sem disputar nenhuma eleição, Temer no poder sela o fim de regimes verdadeiramente democrático, avança com políticas neoliberais, estabelecerá uma agenda de privatizações e o fim de muitos programas sociais, desarticulará mecanismos de controle social, pois não haverá diálogo com a sociedade, governará como um déspota, se afastará dos BRICS e se entregará aos braços das corporações estadunidenses. 
Mesmo nos momento finais da votação do impeachment, a articulação para impedir a inelegibilidade de Dilma, deixa claro que ela não sofreu o processo porque era culpada e tratou-se, na verdade, de um julgamento puramente político, mas ainda neste momento e nos dias que se sucederam fica claro que o grande grupo que está envolvido no golpe não tinha uma visão de consenso.  



Prof. Marcos Geo

quinta-feira, 7 de julho de 2016

COM E SEM CRIME

COM E SEM CRIME


O governo golpista deve abrir as torneiras e jorrar dinheiro público no Senado Federal para tentar aprovar o processo de impeachment e na Câmara dos Deputados para tentar impedir a cassação do bandido Cunha. 
Trouxinhas foram as ruas para acabar com a corrupção e agora tem um governo que busca derrubar uma presidente que não cometeu crime, atestado até mesmo pelos técnicos do Senado Federal e salvar um corrupto com uma extensa ficha de crimes fiscais. 
Em um breve olhar para o passado lembramos que em 1997 o então presidente da república Fernando Henrique Cardoso, o FHC, distribuiu dinheiro na Câmara (com a ajuda do seu finado amigo banqueiro Olavo Setúbal) para aprovar a reeleição para o cargo de presidente e no ano seguinte foi premiado com a sua releição. 




Prof. Marcos Geo




sábado, 2 de julho de 2016

No Reino Unido, 'Brexit' vira tragédia de Shakespeare

Galã e progressista, premiê do Canadá repete fenômeno Mujica e 'bomba' imagem do país


Após sair da união europeia, uma plêiade de pré-candidatos a suceder os atuais líderes dos principais partidos do Reino Unido, o Conservador e o Trabalhista, estão se "esfaqueando" mutuamente

Flávio Aguiar publicado 01/07/2016

macbeth.jpg
'Macbeth', de Shakespeare. Práticas pouco recomendáveis em nome 
do poder marcam momento político no Reino Unido


No continente, multiplicam-se as vozes apaziguadoras, na esperança de que o Reino Unido reconsidere a decisão de seus eleitores pela saída da União Europeia. O secretário de Estado norte-americano, John Kerry, ministros de Relações Exteriores da Eslováquia (que passa a ocupar a presidência da UE) e da Polônia, o ex-chanceler alemão Helmut Kohl, entre outros, manifestaram sua opinião de que não se deve pressionar o Reino Unido, deve-se dar tempo ao tempo, para ver o que acontece…
Mas as esperanças são pequenas sobre a reversão.
Porque no próprio Reino Unido o clima está mais para tragédia shakespeareana e comédia de erros. Uma plêiade de pré-candidatos a suceder os atuais líderes dos principais partidos, o Conservador e o Trabalhista, estão se esfaqueando mutuamente, nos bastidores e em público.
Entre os Conservadores, o atual secretário da Justiça, Michael Glove, “esfaqueou” o ex-prefeito de Londres Boris Johnson, a quem apoiara antes, dizendo que ele não tinha condições de assumir a liderança. Ferido de morte, Johnson renunciou à disputa. Mas isso só fez Therese May, atual secretária do Interior, afiar as próprias facas, assim como os outros pré-candidatos Liam Fox e Andrea Leadsom. O atual chanceler, George Osborne, tirou o time de campo, antes de ser esfaqueado. Desses todos, ninguém quer se comprometer com novo referendo.
Do lado trabalhista, Jeremy Corbyn, o atual lícer, diz que não renuncia, mas, como na peça Júlio César, boa parte dos atuais deputados da Câmara dos Comuns quer apunhalá-lo. Corbyn alega que foi eleito pela maioria dos filiados, enquanto seus desafetos alegam que ele não pode liderar um partido sem a confiança dos deputados. A deputada Angela Eagle, apontada como pré-candidata, ainda não se manifestou.
A cena sugere mais uma peça do italiano Luigi Pirandello, Seis Personagens em Busca de um Autor. A ideia que fica é que quase ninguém esperava o resultado que saiu das urnas, e agora a batata quente (no Reino Unido não dá para dizer o abacaxi…) fica rodando de mão em mão.
Quem sabe a chanceler Angela Merkel possa decidir a parada, em algum corte salomônico… Mas o Reino Unido não é a Grécia.

Enquanto isto, na Áustria...

A Suprema Corte do país, lá chamada de Tribunal Constitucional, anulou o segundo turno da eleição presidencial, de 22 de maio. Nele o independente, mas apoiado pelo Partido Verde, Alexander Van der Bellen derrotou o candidato do Partido da Liberdade, de extrema-direita, Norbert Hoffer, por uma diferença de menos de 31 mil votos, num universo de quase 4,5 milhões de eleitores.
Hoffer, inconformado, entrou com recurso. Depois de ouvir mais de 90 testemunhas, a Suprema Corte decidiu anular o pleito, embora dissesse que não houve manipulação dos resultados. Reconheceu que houve irregularidades na apuração. Por exemplo: os votos enviados pelo correio forma contados antes, em algumas juntas, do encerramento da votação nas urnas. Em outras, membros confessaram que assinaram as atas sem lê-las por inteiro.
Haverá novas eleições no outono. Lá por setembro, outubro, por aí. Até lá, a Áustria ficará  com um presidente interino, pois o atual, Heinz Fischer, já está de malas prontas e não deseja embalar o fondue (também não dá para falar em abacaxi ou pepino).

E na Dinamarca…

Pela primeira vez, de acordo com a nova lei, candidatos a refugiados viram aplicada a nova e controversa lei que permite o confisco de seus bens para custear as despesas decorrentes de sua permanência. Cinco iranianos tiveram, no conjunto, cerca de 80 mil coroas (US$ 12 mil, mais ou menos) confiscadas em valores. A lei permite que cada um fique com apenas 10 mil (mais ou menos US$ 1.500). Além disso, como chegaram com passaportes falsos, serão indiciados por falsificação de documentos.
Para refugiados e imigrantes, a vida não está fácil na Europa, pois eles são o traço comum entre todas estas situações problemáticas. Ou a repulsa a sua presença. Prova de que preconceito não tem fronteiras.


terça-feira, 22 de março de 2016

O GOLPE QUE SE AVIZINHA

O GOLPE QUE SE AVIZINHA


Se passaram praticamente 52 anos, estamos em 2016 a história está aí para nos ensinar diariamente, mas decididamente muitos não querem esse ensinamento, descartam isso por não se importarem com as consequências ou porque são eles herdeiros dos golpistas de ontem.

O Brasil é um país surreal, com uma elite que não deixou a “casa grande” e é capaz do possível e até do impossível para a manutenção de seus privilégios, herdeiros direto da família real portuguesa, que para nossa infelicidade para cá veio e deixou marcas difíceis de apagar, porém agora os tempos são outros, agora fazem uso das vias institucionais, querem aprovar o impeachment, que é um mecanismo previsto em instituições democráticas, porém o que está em jogo são outras questões: a oposição perdeu as eleições presidenciais de 2014 e desde então instaurou o caos no país, instigando a luta de classes e até a xenofobia, quase que dividindo o país durante o período eleitoral e deu continuidade a essas ações posteriormente; pediram recontagem de votos e desde então pedem o impeachment, porém não existe até o momento nenhum crime que pese contra a presidente; se aproveitaram de uma crise econômica mundial e também de falhas na política econômica do governo; acirraram o preconceito contra a presidente, por ser mulher e também por ter sido guerrilheira durante os terríveis anos de chumbo.

Quem preside a Câmara dos Deputados, onde tramita o processo, responde por vários processos de corrupção  ativa e lavagem de dinheiro entre outros, inclusive o STF já o classifica como réu em alguns desses processos, vários outros deputados e senadores já apareceram em delações e até mesmo em ações da operação lava jato e agora se juntam no coro pelo impeachment com o objetivo de derrubar o governo e consequentemente, com o novo governo peemedebista, frear a lava jato, junto a polícia federal e consequentemente parar as investigações e o juiz Sérgio Moro será orientado a fazer o mesmo, estes provavelmente, só se concentrará na destruição de políticos petistas, supondo que Sérgio Moro já não esteja a serviço da oposição, não interessa a eles o melhor para o país e sim os seus próprios interesses, eles representam a elite branca; o PSDB está há quatro mandatos fora do poder tem receio de ficarem mais oito anos, em uma eventual candidatura de Lula para as eleições de 2018, buscam eliminar o PT e Lula, para quem sabe assim ganharam por W.O. por estes e outros motivos se trata de um golpe e não de uma ação desencadeada para a preservação da democracia.

Os golpistas de 1964 não identificaram crimes cometido por Jango, este anunciou implementação de medidas populares que atenderiam os anseios das classes menos favorecidas, mesmo assim sofreu um golpe, que teve apoio das elites, de muitos empresários e políticos, infelizmente visualizo a sua reedição, o golpe deve ser branco, dando a falsa impressão, para os mais desavisados, que trata-se de uma ação justa e correta. Como em muitas outras passagens de nossa história a elite costura uma trama complexa e ampla que ilude a todos...
Somente a incansável luta dos movimentos populares e uma estreita e ampla frente popular pode frear o golpe que vislumbramos, bradando nas ações: "#nãovaitergolpe"; mas se ainda assim o golpe ocorrer não devemos sair das ruas, a mudança de lado não resolverá conflitos, a crise é muito mais política do que econômica, necessitando de mudança estruturais



Prof. Marcos Geo


quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

POR UMA NOVO MUNDO, SEM CAPITALISMO

POR UMA NOVO MUNDO, SEM CAPITALISMO

Escritor aborda semelhanças – e dessemelhanças – entre Marx e Weber e o ecossocialismo para conter a catástrofe humana e ambiental do capitalismo.
Por Aray Nabuco
Entrevista com MICHAEL LÖWY,cientista e escreitor radicado na França desde a década de 1960 e onde atualmente é diretor de pesquisas do Centro Nacional da Pesquisa Científica, que aborda semelhanças – e dessemelhanças – entre Marx e Weber e o ecossocialismo para conter a catástrofe humana e ambiental do capitalismo.

Caros Amigos - Queria que você pontuasse onde Weber encontra Marx nessa crítica ao capitalismo. Na coisificação das pessoas, na humanização das coisas?

Michael Löwy – O Weber ao mesmo tempo em que era crítico do Marx – obviamente não tinha nada a ver nem com marxista, nem com socialista –, tem uma crítica ao capitalismo bastante radical em alguns textos. Não em todos, sobretudo em A Ética Protestante. E ele, em alguns pontos dessa crítica, vai coincidir com Marx. Por exemplo, em algumas passagens ele até diz “estou usando o conceito marxista de mais-valia”. Isso não é o mais típico. Mas há um argumento dele que também é importante em A Ética Protestante, que ele vai retomar em outros escritos, que é que o capitalismo é um sistema no qual os meios substituem os fins. Quer dizer, o dinheiro, a acumulação do dinheiro, a acumulação do capital,investimento etc., já não é um meio para a satisfação das necessidades, para o prazer, para uma finalidade. É um fim em si. Há uma inversão entre meios e fins, que é irracional. A relação natural seria: você trabalha para poder usufruir da sua vida, satisfazer suas necessidades. Tudo é em função do capital, dessa acumulação. O meio virou o fim. Engraçado que o Weber tem uma conferência sobre o socialismo, que é uma conferência contra o socialismo, dada para um grupo de oficiais do exército austríaco. Então, completamente crítico do socialismo. Mas ele diz: “a verdade é que o capitalismo é um sistema que converte, transforma, substitui os meios pelos fins”. E isso é o que os socialistas dizem. Então, em algum momento chave, apesar da grande referência contra o socialismo, nesse aspecto, o argumento dele acaba coincidindo com os socialistas. Então, um pouco tem a ver com essa questão da reificação. O que predomina já não é a dimensão humana. É o capital, é a indústria, é a produção, isso que é importante. O ser humano, os seus governos, a felicidade, não importam. Agora, outras críticas do Weber são no mínimo contraditórias, mas são diferentes do argumento marxista. São complementares, eu diria. E é o caso dessa ideia de A Jaula de Aço. Que também de certa maneira está presente em Marx. O capitalismo é um sistema total, que determina totalmente a vida das pessoas. Não só as que trabalham no sistema,  mas todo mundo tem o seu destino determinado pela lógica do sistema capitalista. Então, estamos todos encerrados numa jaula de aço, sem saída.
É daí que vem a ideia da jaula de aço?
Exatamente. Aliás, a expressão exata é “habitáculo duro como aço”. Foi traduzido para o inglês como “Jaula de Aço” (Iron Cage), e a expressão pegou. Tem uma outra frase que o Weber usa que é “o capitalismo é uma escravidão sem mestre”. Quer dizer, uma escravidão impessoal. São escravizados não por outro indivíduo, mas por um sistema anônimo. As leis da economia, competição, competitividade, essas coisas impessoais. Então, são argumentos duros contra o capitalismo de alguém que não era um anticapitalista. Ele achava que o capitalismo era o sistema mais racional possível, muito superior a todos os anteriores e, sobretudo, achava que não tinha alternativa. Ele achava que o socialismo era uma ilusão. Então, a grande diferença dele para o Marx é essa. O Weber é um pessimista resignado, enquanto Marx é um otimista revolucionário, aposta na possibilidade de uma alternativa ao capitalismo. Mas no diagnóstico, o que o capitalismo faz aos indivíduos, há muita proximidade, muita afinidade, às vezes, certa complementaridade.
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Que elementos ele tinha ou em que se baseou para fazer essas críticas ao capitalismo, que estão evidentes mais de cem anos depois?
A ótica com a qual ele critica o capitalismo é diferente da de Marx. É o que eu chamo de pessimismo cultural ou uma forma de romantismo, que no fundo é uma crítica ao capitalismo em nome de valores do passado. Quer dizer, nas sociedades pré-capitalista, as finalidades humanas é que predominavam, o indivíduo não era prisioneiro das estruturas econômicas. Às vezes explicitamente, às vezes implicitamente, essa ideia de que o capitalismo representa um imenso progresso em termos de racionalidade. Mas do ponto de vista humano, social, ético, cultural é uma regressão. Agora eu acho que tanto Weber como Marx conseguiram captar elementos essenciais do capitalismo. Mais além de elementos específicos da época, captaram alguma coisa essencial do capitalismo, que hoje em dia só foi intensificada. Multiplicada por dez, por cem. Então, por isso é que são tão atuais.
Na crítica anticapitalista de Marx, ele avança e propõe uma solução – a organização do proletariado e a tomada do poder.Weber chega a propor alguma coisa que se aproveite para alguma revolução anticapitalista?
De jeito nenhum. Ele acha que o socialismo é uma ilusão, que os socialistas vão agravar os problemas do capitalismo. No fundo, ele era um pessimista resignado, tipo “o capitalismo está aí, não gostamos dele, mas não tem outro”. Um estado de espírito um pouco nietzscheano. Nietzsche dizia que temos que aceitar o destino, que o herói é aquele que aceita o destino, que é inevitável. Weber tinha um pouco desse pessimismo nietzscheano. Agora, curiosamente, em A Ética Protestante, que é o livro mais importante do Weber, no finzinho do livro, tem uma parte em que ele mesmo diz “agora eu vou deixar de desenvolver meu argumento científico, objetivo, sem juízo de valor, eu vou dar minha opinião. Tanto pior”. Ele mesmo diz isso. Então, nessas últimas páginas, ele dá livre curso quase que à sua afetividade, ao seu sentimento. Aí ele quase que joga um pouco a ideia de uma utopia, mas não é uma utopia socialista, é uma utopia romântica. Então, ele diz assim, “o que vai acontecer no futuro? Será que vamos caminhar para uma espécie de petrificação da sociedade, uma espécie de volta ao que era o mundo dos faraós do Egito, uma espécie de sistema totalmente fechado? Ou quem sabe haverá outra via, aparecerão outros profetas?”. Porque Weber tinha muita admiração pelos profetas bíblicos judeus. Ele achava que os profetas tinham rompido com a magia e introduzido uma religião ética, baseada em valores éticos. Então, diz Weber, “quem sabe aparecerão novos profetas, que voltarão a visitar princípios éticos e quem sabe haverá uma reincidência dos antigos valores?”.
Quais são esses valores?
Ele não explicita, mas tem uma frase que é assim: “O risco é que o mundo do futuro será um mundo de especialistas sem espírito e sem coração”. Então, o que são os valores que ele acredita? É o espírito e o coração. O espírito que é a inteligência, a cultura, a razão. E o coração, que é o amor. Weber é um romântico. E a utopia dele, se existir, seria uma utopia romântica de uma ressurreição de valores do passado, graças a novos profetas, mas que ele mesmo não chega a acreditar. Ele só está um pouco jogando com essa ideia. Mas é só nesse livro. Não é em nenhum outro lugar.
Surgiram alguns outros profetas, em sua opinião, desde Weber? Os profetas da sustentabilidade, por exemplo?
Não sei. Eu não me animaria. Houve falsos profetas. Muitos. A começar por Adolf Hitler. Mas isso não é culpa do Weber, coitado (risos).
Sempre que se coloca hoje a crítica anticapitalista chega-se também à crise ecológica, à crise ambiental, que torna bem evidente o suicídio que é o capitalismo. O que o marxismo traz como alternativa a essa crise ecológica, quando se faz a crítica ao capitalismo com esse viés ambiental?
Eu me permito fazer 30 segundos de publicidade, acabo de publicar um livro que se chama O que é o Ecossocialismo?, que justamente discute essa questão. Eu acho que o marxismo tem uma crítica, já em Marx e alguns marxistas se encontram elementos de crítica de como a dinâmica do capitalismo leva à destruição do meio ambiente, ao envenenamento do solo, à destruição das florestas. Isso já aparece em Marx, mas muito pouco desenvolvido. Isso precisa ser retomado. Colocado não como uma questão marginal, mas como um tema central. A segunda é que aparece em alguns textos do Max Weber, mas muito mais no marxismo do século 20, nas suas correntes dominantes, uma visão produtivista, segundo a qual o socialismo
só tem como objetivo mudar as relações de produção, substituir a propriedade privada pela propriedade coletiva para desenvolver livremente as forças produtivas. Aí tem que se tomar distância em relação a essa posição, para se colocar, em relação às forças produtivas, o que o Marx dizia em relação ao aparelho do Estado: que a revolução não pode tomar o aparelho do Estado como ele existe, capitalista. Tem que acabar com ele, transformá-lo radicalmente, substituí-lo por outra coisa. Seria um poder democrático dos trabalhadores. E a mesma coisa eu acho que vale para o aparelho produtivo. Esse aparelho produtivo que está aí, baseado nas energias fósseis, no petróleo, é o que está nos levando ao desastre ecológico. Precisamos pensar em uma transformação radical das relações de produção, do modelo de consumo, do modelo de transporte. No fundo, é uma mudança no modelo de civilização capitalista, industrial, ocidental moderno. Essa ideia, eu acho que parte do marxismo, mas tem que ir além do que está escrito em Marx e Engels, em Trotsky ou outros, como Gramsci, para incorporar a crítica ecológica produtivista. A gente precisa fazer uma síntese do que há de melhor no marxismo e no pensamento ecológico. Isso é o que a gente chama de ecossocialismo.

Fiz essa pergunta porque a preocupação com o ambiente, hoje, é um fundamento e porque Marx também tem a ideia do desenvolvimentismo e do progresso, que também estão na base da expansão capitalista.
Há os dois elementos em Marx. Há uma visão produtivista, do desenvolvimento das forças produtivas. Mas existe, paralelamente, essa ideia de que as forças produtivas estão destruindo o meio ambiente e que numa sociedade socialista temos que organizar o metabolismo, a sociedade humana,
e a natureza de outra forma, que permita deixar para as gerações futuras um planeta em condições viáveis. Essa ideia aparece em Marx. Não está desenvolvida, mas aparece. Portanto, precisamos retomar essas ideias, desenvolvê-las e incorporar problemas que não eram da época do Marx e que hoje a gente está vivendo. A crise ecológica da nossa época é mil vezes mais grave do que a do século 19.

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O senhor acha que a esquerda está incorporando esse pensamento de Marx? O que eu quero dizer é que, hoje, tanto os partidos de esquerda quanto os da direita, fazem o discurso da sustentabilidade, esse tipo de coisa que é óbvio que a gente tem que perseguir, mas que, do jeito que propagandeiam, não muda estrutura nenhuma. Como a esquerda deveria se posicionar diante desse discurso da sustentabilidade?
A palavra sustentabilidade, infelizmente, ficou totalmente esvaziada, porque todo mundo fala em sustentabilidade. O Banco Mundial fala em sustentabilidade; as companhias de petróleo falam em sustentabilidade etc. Deixou de ser uma palavra com conteúdo, virou uma coisa vazia. Então, a gente precisa colocar uma visão muito mais crítica, muito mais radical. Para que exista o que a gente chama de sustentabilidade, precisamos transformar radicalmente as estruturas econômicas, sociais, as fontes de energia, o modo de consumo. É uma revolução civilizacional. Não é bom dar um pouco mais de dinheiro para que as empresas fabriquem de modo menos sujo. Não, não dá pra corrigir na margem, você tem que pegar o problema pela raiz. E a raiz é o próprio sistema. O sistema capitalista não comporta a sustentabilidade. A lógica dele não comporta isso. Um capitalista que queira dar ênfase à ecologia vai à falência, porque seus concorrentes não dão. E não é por acaso que as conferências internacionais tenham fracassado. Porque cada país capitalista defende os seus produtores para ganhar mais mercado e a ecologia vai para o brejo. A única esperança que podemos ter é em coisas como essa que aconteceu ontem em Nova Iorque (manifestação popular, no fim de setembro, durante cúpula do clima). Saíram na rua 400 mil pessoas contra as mudanças climáticas, cobrando o governo, criticando. Formidável. É um acontecimento histórico. Nunca houve isso. E, claro, todo mundo participou. Foi meio unânime ver o Ban Ki-moon, das Nações Unidas; o prefeito de Nova Iorque, o Al Gore (ex-vice presidente dos Estados Unidos). Na cabeça da manifestação estavam os índios americanos, que estão lutando pela natureza há séculos. Mas foi um belo acontecimento. Isso dá alguma esperança, porque se for esperar os governos, francamente…
Já vi pesquisas mostrando que a maior parte das pessoas estão dispostas a abrir mão de conforto, de várias coisas para reduzir os impactos ambientais. Mas o sistema não vai deixar.

O Thomas Picketty cita toda essa crise capitalista também e chega a falar de uma crise estrutural de civilização. O senhor acabou de citar mais ou menos isso. É o caso da gente falar de uma mudança de era? De enterrar a Era Industrial, seus valores de progresso, de desenvolvimento econômico e passar para um outro momento?
Eu acho que sim. O que a gente chama de mudança de paradigma de civilização é uma mudança de era histórica, de certa maneira. Em que, no mínimo, tem que se dar aos conceitos de progresso, de desenvolvimento, um conteúdo completamente diferente. Progresso não é acumulação de produtos e de mercadoria; não é aumentar o PIB. Progresso é você viver de uma maneira mais harmônica, com outro relacionamento com a natureza, com outro tipo de necessidade. Marx tem uma bela frase que diz: o importante não é ter mais e mais produtos, acumular bens; o problema é você ser, se realizar como ser humano. Isso que é fundamental para pensar uma nova era, uma nova civilização. Que inclua os valores não de mercado, de economia, mas valores humanos. Exatamente. Valores humanos. E a produção industrial, obviamente, mas em função das verdadeiras necessidades, que são aquelas que sempre existiram. Todas as pessoas têm necessidade de comer, de morar, de vestir, de cultura, de saúde.
Agora, aquelas que são artificialmente induzidas pela publicidade, compra aquilo, compra outra, isso é que precisa acabar. Tem gente defendendo aqui e ali o downgrade da economia global. Diminuir o PIB, diminuir o volume de dinheiro, decrescimento da economia. O senhor acredita nisso?
Eu acho que esse pessoal de decrescimento tem muitas qualidades, mas alguns defeitos. A qualidade deles é desmistificar a religião do crescimento. Essa ideia de que o crescimento vai resolver todos os problemas, vai resolver o desemprego, vai acabar com a pobreza. Acabar com essa mistificação do crescimento. E eles também têm essa qualidade de lutar contra essa ideologia do consumo,essa obsessão neurótica. Eles vão contra isso e eu acho isso muito justo, muito importante. Agora, o problema que eu vejo é que o conceito de decrescimento é um conceito quantitativo. Os governos dizem: nós queremos que o PIB aumente em 10%. Aí vem o pessoal do decrescimento e diz: não, ele tem que diminuir em 10%. Eu acho que a colocação tem que ser qualitativa. O que eu quero dizer com isso? Que algumas atividades a gente deveria não só reduzir, mas suprimir. Por exemplo, a publicidade, a energia atômica, o carvão. Tem uma lista enorme de coisas que são inúteis, perigosas e que precisamos suprimir o mais rápido possível. Outras coisas, a gente tem que reduzir, como circulação de automóvel etc. E outras coisas a gente precisa aumentar. A gente quer aumentar a agricultura biológica, que até agora está muito pequena. A gente quer aumentar as energias renováveis,
eletricidade solar, do vento etc., expandir as renováveis para acabar com as energias fósseis. E a gente quer expandir saúde, educação. Tem várias coisas que a gente quer expandir, outras que a gente quer reduzir, outras que a gente quer suprimir. Então, o conceito de decrescimento não dá essa diversificação qualitativa, essa é a minha crítica. Mas eu reconheço que eles têm uma contribuição positiva.

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Eu gostaria de retomar um pouco sobre Walter Benjamin, tudo indica que toda aquela crítica que ele faz, inclusive a crítica anticapitalista, veio se concretizando, não é verdade, professor?
Benjamin efetivamente tem elementos quase proféticos, ele foi um profeta desarmado, teve que se suicidar. Um deles é justamente sobre essa questão ecológica. Ele tem, por exemplo, naquele livro inacabado dele, sobre as passagens de Paris (Paris, Capital do século XIX), ele diz que a relação do capitalismo com a natureza é destruidora, é assassina. E que podemos aprender outra relação com a natureza com os povos chamados primitivos. Eles têm uma relação que considerava a natureza como uma mãe generosa. É quase palavra por palavra os textos da Conferência de Cochabamba realizada por Evo Morales, na Bolívia, há dois anos, sobre a mudança climática e a defesa da Mãe Terra. O capitalismo destruidor, assassino da natureza, assassino da Mãe Terra, da Pachamama. E as tradições indígenas dão o exemplo de outro tipo de relação com a natureza. Já está sugerido ali no próprio texto. Acho que Benjamin é um pensador que tem muito a nos ensinar.
A esquerda está sabendo se aproveitar dessa crise ambiental para conseguir avançar sua proposta de mudança? Você acha que a esquerda está conseguindo passar isso tanto para os seus militantes quanto para as pessoas?
Sim e não. Para boa parte da esquerda, a ficha não caiu ainda. Continuam apostando no desenvolvimentismo etc. Outros já reconhecem que é um problema, que isso deve ser levado em conta, mas ficou um dos trinta capítulos do programa, não uma coisa central. Agora, uma parte da esquerda já está levando a sério, dando conta de que você não pode pensar o socialismo do século 21 sem ecologia. Isso é um desafio central. Uma parte da esquerda já está colocando isso e o ecossocialismo é imprescindível. E, hoje em dia, o ecossocialismo tem uma influência
crescente, pequena, mas crescente, nos Estados Unidos, na América Latina e na Europa, onde vários partidos da esquerda mais radical já assumem o ecossocialismo. Na Conferência da Esquerda Europeia já se discutiu o ecossocialismo e houve bastante simpatia. E houve duas conferências ecossocialistas na América Latina esse ano, uma em Quito (Equador) e outra em Caracas (Venezuela). Algo está se mexendo, mas acho que a coisa tem que ir mais depressa.

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Os capitalistas e essa esquerda lutam pelas fábricas. Mas a questão não seria se vamos manter essa fábrica ou fechá-la? A luta, hoje, passa por essa decisão?
Passa. Mas acho que é importante tomar a fábrica, porque as condições em que ela vive faz ela produzir outra coisa. Porque o capitalista que produz carro, nunca vai deixar de produzir carro, que polui. Então, se houvesse um trabalhador com consciência ecológica, ele vai poder tomar essa fábrica e decidir produzir bicicleta, por exemplo. Então, eu acho que é essa coisa: uma fábrica a gente quer fechar porque só produz porcaria; outra, a gente quer reorganizar para produzir outra coisa e outras são fábricas que não existem, que a gente vai criar. Ou existe muito pouco, por exemplo, para produzir equipamentos para energia solar, que ainda tem muito pouco e é caro. E assim por diante… A gente está vivendo um momento de grande concentração de riqueza, inclusive foi o que aprofundou a crise na Europa e provocou a crise nos Estados Unidos.
Como romper essa força que hoje agrega não só o poder financeiro e político, mas o tecnológico?
Eu acredito primeiro que para resolver esses problemas econômicos, ecológicos, sociais, você tem que mudar o sistema. Então, é aquela palavra de ordem, que apareceu inclusive naquela manifestação em Nova Iorque, “precisamos mudar o sistema, não o clima”. Agora, o sistema tem uma potência enorme, ele concentra o domínio econômico, financeiro, industrial, tecnológico, da mídia, tudo, essa turma da oligarquia financeira e também a oligarquia fóssil, do petróleo. Por outro lado, a insatisfação cresce, a indignação cresce, volto a falar dos 400 mil em Nova Iorque, a esperança nossa é essa. E obviamente todo mundo que está na rua hoje não se dá conta de que precisamos de uma revolução, do ecossocialismo. Nós precisamos partir de coisas muito concretas, reivindicações muito concretas, aqui e agora. Precisamos começar com isso.Então, por exemplo, nos Estados Unidos impedir aquele pipeline (dutos), que ia vir do Canadá trazendo petróleo sujo, um desastre, que os indígenas já falavam. Conseguir quebrar isso é um passo. As pessoas que se mobilizam começam a tomar consciência. Quem são seus inimigos, quem são seus aliados? Isso vai politizando as pessoas. Aqui no Brasil reivindicar desmatamento zero para a Amazônia, vai contra os interesses sistêmicos e o agronegócio fica furioso. Levar à frente essa batalha é fundamental. Isso são atitudes que a gente precisa começar aqui e agora. Sabendo que cada um desses objetivos que a gente conseguir, a gente tem que passar para um etapa superior. Levantar a próxima reivindicação, que é uma dinâmica até que a gente consiga dar a volta por cima.
Como o senhor vê a ascensão das forças conservadoras tanto na Europa, nos Estados Unidos, mesmo aqui no Brasil?
Realmente, é muito preocupante. Está abraçando quase todos os países da Europa. De formas diversas. Em alguns casos, é uma espécie de nacionalismo de direita, xenofóbico; em outros casos é diretamente fascista ou mesmo neonazista, como na Grécia. Mas é muito preocupante. Eles não são só conservadores, são racistas, são xenofóbicos, islamofóbicos, alguns são antissemitas. É um pessoal realmente muito preocupante. Em parte, tem a ver com a crise, mas não dá para explicar só pela crise. Países como a Áustria e a Suíça, em que há muito pouco desemprego, muito pouca crise, são países em que esses partidos racistas são mais de 20% dos votos. Enquanto na Espanha e em Portugal, que são países que estão no fundo da crise econômica e social, não há esse fenômeno. Então, a crise não explica tudo. É um defeito de alguns amigos meus marxistas, que acham que a economia explica tudo. Mas tem a ver com o passado colonialista da Europa, tem vários aspectos. É difícil explicar, mas é muito preocupante. Vocês aqui na América Latina têm muita sorte, porque apesar de tudo, isso tem pouco peso. Extrema direita, fascista existe, mas não é força política. As disputas políticas se dão entre esquerda e direita.
Porém, nós aqui na América Latina também temos os nossos governos que foram eleitos como governos de esquerda e populares e hoje são criticados por fazerem alianças com os neo-liberais. O que está acontecendo? Esses governos precisam dessas alianças? Como é que o senhor enxerga essas críticas?
Eu não acho que esse processo é inevitável.Eu acho que os governos de esquerda que foram eleitos podiam ter ido muito mais longe na realização de seu programa. Mesmo porque algumas experiências na América Latina foram bem mais longe do que o Brasil, do que o Chile. Mesmo a Bolívia, o Evo Morales foi muito mais longe no enfrentamento com as multinacionais, com as oligarquias, com o imperialismo do que o Brasil ou o Chile. Eu acho que a gente tem dois tipos de governo de esquerda na América Latina: uns que são antioligárquicos e anti-imperialistas, como é o caso da Venezuela e da Bolívia; e outros que dizem ser social-liberais. Ou seja, praticam uma política econômica ortodoxa, neoliberal; mas tem uma preocupação social com os pobres que a direita não tem. Então, faz uma diferença, mas não rompe com o modelo. Na Bolívia e na Venezuela houve um início de ruptura com o modelo neoliberal. Eu acho que essa política de fazer média com o sistema não é inevitável.
Eu citei o Thomas Picketty. O que o senhor acha dele?
Eu acho que o diagnóstico do Thomas Picketty sobre o capitalismo atual, como ele gera necessariamente desigualdades cada vez mais absurdas, é muito justo, é impecável. O problema é que as soluções que ele apresenta são falhas. São soluções que permitem que o sistema corrija poucos abusos, mas não muda a corrente.
Quais pensadores da América Latina, marxistas, que o senhor admira hoje ou que conhece?
Do passado, a figura que eu mais admiro é o José Carlos Mariátegui, que foi jornalista, escritor, filósofo, sociólogo. Porque para mim é o primeiro grande pensador marxista daqui. Ele é conhecido como autor de um livro sobre o Peru, Sete Ensaios Sobre a Realidade Peruana, mas eu acho que isso é uma visão muito limitada, ele tem uma obra muito mais rica, filosófica, inclusive. Para mim, ele é o equivalente latino-americano dos grandes pensadores marxistas do século 20, o jovem Lukáks, o jovem Gramsci, o jovem Walter Benjamin… Há semelhanças impressionantes entre o Mariátegui e escritos do Benjamin, nos anos 20. Eu acho que a gente tem que valorizar Mariátegui não só como um grande marxista, mas como alguém do mesmo porte dos grandes pensadores marxistas europeus da sua época.
E vivo, tem algum?
Eu vou falar dos meus amigos (risos). Roberto Schwarz é um dos maiores críticos literários, não só da América Latina, mas do mundo, marxista. E tem uma geração jovem que está aparecendo,gosto muito de uma moça brasileira, Isabel Loureiro, que acho que é uma das pessoas que procura retomar a tradição marxista. Eu acho que tem bastante gente. No Brasil, tem muita gente produzindo pensamento marxista, o Vladimir Safatle… O Brasil é um dos países do mundo onde há mais produção intelectual marxista.
Para encerrar, como foi a aproximação do senhor com o PSol?
Embora eu morasse na Europa, eu participei do processo de formação do PT, muito entusiasmado com o Lula, apostei, me identifiquei. Até o momento da eleição do Lula. O Lula estava fazendo muitas concessões e, rapidamente, eu tive a impressão que a política do governo não ia ser aquela do programa de governo. O programa do PT era anticapitalista, um governo socialista. E o que a gente vê logo no começo é fazer média com o liberalismo. Isso foi se agravando até chegar naquela infeliz história da reforma da Previdência e um pessoal da esquerda do PT não aceitou. Foram expulsos, fundaram o PSol e eu me identifiquei.

Aray Nabuco é jornalista.

Fonte http://www.carosamigos.com.br/index.php/grandes-entrevistas/5756-entrevista-michael-loewy